
(Ainda no acampamento)
Os dias ia passando e juntos fazia-mos nossas vidas, partilhávamos nossas tarefas e contávamos uns aos outros nossas experiências e nossas vivências, todos tínhamos algo para contar, todos já havíamos vivido vidas e muitas experiências, umas boas outras más, mas todos tínhamos algo que desejávamos falar, partilhar, alguns se sentiam um pouco menos à vontade, mas logo, logo acabávamos falando algo.
Mas, nem todos éramos iguais, nem todos reagíamos igual, e aí é que está a beleza, pois com a maturidade que íamos ganhando íamos aprendendo que todos temos o direito à vida e todos temos o direito de errar e de nos aceitar-mos uns aos outros, tal como somos.
Foi num final de tarde que tudo aconteceu, Maria, tinha seu jeito muito peculiar de viver, de ser de estar, era já uma senhora com alguma idade, mas nem por isso com menos energia que os outros, mas toda a sua vida havia “comandado” por assim dizer um exercito de gente, havia tido uma carreira maravilhosa da qual se orgulhava, um marido maravilhoso que sempre estava a seu lado em todas as horas, e uns filhos muito desejados e amados, enfim, uma vida comum, mas uma vida cheia de emoções. Maria apesar de já não ter junto dela seus filhos nem estar mais a trabalhar, pois havia se reformado, continuava com aquele jeito meio engraçado (para uns) e aborrecido para outros de tudo fazer como se ela fosse no comando de tudo, afinal ela tinha experiência de levar tudo bom porto e de tudo fazia para proteger todos de tudo, mas aqui Maria por vezes se sentia frustrada, pois mesmo tentando comandar todos sempre havia algum que não se sentia bem com sua maneira de estar, mas por alguma educação todos nos deixávamos levar um pouco por ela.
Maria não o fazia por mal, afinal, havia sido assim quase toda a sua vida, e tinha tido bons resultados, seus filhos haviam crescido e se tornado bons homens e mulheres e bem sucedidos, no seu trabalho ela havia dado de tudo para deixar sempre bem, e o deixou, deixou a disciplina e a maravilhosa crença de que tudo se pode alcançar se levado com orientação e força de equipe, e estes foram alguns uns dos legados que ela se orgulhava.
Hoje, Maria precisava de mais, e sabendo que tinha direito à FELICIDADE, ao AMOR, à HARMONIA e à PAZ, ela havia aceitado mais este desafio de começar uma nova jornada, uma jornada que a levasse a ter tudo isso ainda mais, pois sabia que tinha direito e que também tinha ainda muito para dar aos outros. E assim foi, após um grande desgosto Maria voltava a percorrer novos caminhos na vida, mas com ela guardava um segredo, a razão que a levava todos os dias a se afastar de nós por breves momentos, mas muitos não reparávamos, ou simplesmente deixávamos, afinal, era assim que ela era.
Num final de tarde quando todos nos juntávamos perto de uma fogueira para nos aquecermos e juntos falarmos, rir-mos e orar-mos, lá estava Maria contando, ela sempre fazia isso, contava quantos éramos e se faltava alguém, logo Maria exclamava:
Estamos todos, ou simplesmente está faltando um, onde anda, o que está fazendo, será que não vê que esta é a altura que devemos estar todos juntos, que é quando nunca nos devemos separar?
Isto por vezes irritava alguns.
Mas naquele final de tarde, quem faltava, era Gabriel, e ela se preocupou muito, pois ela sabia que não era seu jeito chegar atrasado a nada e muito menos desaparecer sem nada dizer, nessa altura Maria ficou de tal modo preocupada, que começou buscando por todos os sítios, e nos fez procurá-lo em todos os lugares possíveis e imaginários, e mesmo assim Gabriel não aparecia, porque seria?
Ela conhecia Gabriel fazia mais de 50 anos, uma vida, e naquela altura tudo parecia desabar, mas nem por isso deu parte fraca, não era de seu feitio assim ser. Pediu-nos que continuasse-mos procurando por ele e assim o fizemos, até que já ia tarde na noite e muitos haviam regressado ao acampamento, mas não estavam precupados, porque será?, sim porque será que muitos de nós estávamos em PAZ com tudo isso?
Até que um nós exclamou:
Maria, Maria…
Mas Maria não ouviu, ela estava de tal forma preocupada com Gabriel que não escutava nada, e se afastava cada vez mais do acampamento em busca de Gabriel.
No acampamento todos exclamavam:
Mas porque ela busca por ele assim?
Quem é ele?
Como é ele?
Algum de vós sabe dizer?
Naquele momento já íamos ficando preocupados com Maria, mas algo nos detinha no acampamento, a falta de nos organizarmos como um grupo de busca, como íamos fazer para procurá-la, para a encontrar-mos?
Maria fazia muita falta, ela tinha em si um espírito guerreiro e lutador, mas hoje era ela que precisava de ajuda, pois estava desorientada e quem era esse Gabriel?, que a levava a ficar assim?
Já cansada, mas não vencida Maria se deteve perante uma clareira, e olhando bem viu um clarão de LUZ brilhando, olhou e com lágrimas no rosto e viu, era Gabriel que ali estava à sua espera, queria falar-lhe, queria dizer-lhe muita coisa, mas Maria não aguentou e pela primeira vez desde há muito tempo chorou e lhe perguntou:
Gabriel porquê?
No acampamento todos já estávamos prontos para procurá-la, mas mantinha-se uma questão, quem era Gabriel?, sim quem era Gabriel?
Mas com essa pergunta em nossa mente, procurá-mo-la até que vimos algo de muito belo, algo que nunca olhos alguns haviam visto.
Estávamos perante algo de tão belo e emocionante que todas as perguntas de quem era Gabriel ou quem era ele, se desfizeram naquele momento.
Sem nos ver Maria se abraçou a Gabriel e chorando apenas lhe perguntava na sua voz soluçando:
Porquê, meu amor, porquê…?
Porque te vais, sabes o quanto preciso de ti, sabes que sem ti não sei viver, sabes que foste meu grande e único amor, sabes ainda que não me podes deixar, não agora, peço-te…
Gabriel lhe respondeu:
Maria meu amor, foram 50 anos de um grande amor que nunca esquecerei, e se naquela tarde parti foi porque era chegada minha hora, foi porque ELE me chamou, e se depois voltei, foi porque te amo muito e não suportei ver-te chorar, eu sei que de forte te fizeste, que alegras-te o coração de nossos filhos, e lhes explicas-te minha partida, mas sei que teu sofrimento era grande demais e meu também ao te ver assim naquela maneira, logo tu, meu amor que sempre foste uma alma grandiosa e feliz. Foi por isso que regressei para te acompanhar por mais um tempo e te ajudar a encontrar um novo rumo…
Mas Gabriel que farei novamente sem ti?
Maria, meu amor tua vida continua aqui até ao dia em que Deus te chame para junto Dele e de mim, até lá acredita que jamais te abandonarei, estarei junto a ti, a teu lado tal como nestes anos todos que vivemos juntos, mas meu amor, não posso mais aqui ficar assim, não parto, apenas deixarás de me ver com esses olhos lindos, mas me sentirás, e tua alma estará sempre junto com a minha, elas continuarão sempre unidas, agora Maria, não chores, arregaça as mangas e mãos ao trabalho, tens muito ainda para dar, tens muito para oferecer e receber. Teus companheiros de jornada estão ali à tua espera, vai, vai para junto deles e sê FELIZ, continua a AMAR e a ser GRATA por tudo.
Um dia nossas almas voltarão a estar unidas para todo o sempre!!!
Nós ali olhando tal amor, tamanha beleza e atónitos com tudo, nos olhámos, e um de nós exclamou:
Então…
Maria, falou:
Sim, meus lindos, este era o meu segredo, o Gabriel, o meu grande amor, acreditem, sempre pensei que todos o viam.
Não, Maria, somente tu meu anjo, pois era por ti que ele estava aqui.
Sim, acredito agora que sim, e sei que ele onde quer que esteja está bem e feliz.
Naquele momento Maria sorriu e junto connosco voltou ao acampamento, enquanto apareciam os primeiros raios de sol que lhe aqueciam e afagavam o coração.
Álvaro Gonçalves