segunda-feira, 10 de julho de 2017

Estórias da minha história...

 


 
Nasci à quase 50 anos, tive uma infância meio conturbada devido a problemas de saúde, mas nada que me impedisse de ir para a escolinha, aprender a nadar desde bebé, algo pela qual me apaixonei logo que comecei a aprender, também tive uma professora de natação impecável, muito querida e muito atenciosa, que nos tratava como se de filhos fossemos, aos 3 anos já nadava feito um peixinho (palavras desta encantadora professora aos meus pais e não só), continuei sempre na natação até aos 6 anos e meio quando a guerra estalou e eu e meus pais fugidos com apenas com a roupa do corpo e uma mala feita à pressa (aquelas chamadas de malas de cartão, que pareciam um pequeno armário e mais nada), se não tivesse sido uma de minhas tias maternas, naquela altura teríamos tido um destino muito mau, sem nada para sobrevivermos, como tantos que também fugiram.
Naquela altura não me apercebi de nada, era pequeno demais e meus pais tentaram poupar-me de algumas coisas, embora soubessem que algum dia, em breve teriam de me contar, foi por esse motivo que com a ajuda de amigos e familiares e a venda de algumas joias que minha mãe havia conseguido salvar escondidas junto ao seu corpo, debaixo da roupa larga que muitas vezes gostava de usar, que conseguirem algum dinheiro para irmos passar alguns dias, creio que uma semana ao Algarve, num pequeno apartamentougado, era setembro, mês de meu aniversário, e foi aí que eu que por natureza já era desconfiado (tal como meu pai sempre dizia), que depois de tanto falar e chatear consegui que me dissessem, porque naquele ano, eu ia passar os meus anos, naquele sitio, é que era habitual, sempre que vínhamos a Portugal continental eu passava os meus anos junto com minhas tias, tio e primos.
Foi aí que o meu mundo caiu, nunca mais voltei a ser o mesmo. Mas o tempo foi passando e eu crescendo, sempre me sentindo diferente de tudo e de todos, como se não pertencesse a este “mundo”, entretanto nasceu minha irmã, tinha eu 7 anos e meio, era linda, parecia uma bonequinha, tão rechonchudinha, tão fofinha, minha vida alegrou um pouco, mas como nada…, seja bom ou mau dura para sempre, o bom acabou, e tivemos de deixar onde morávamos há cerca de dois anos e fomos viver para os Açores, mais precisamente para a ilha de São Miguel, e foi aí que meu mundo começou a desmoronar mais do que ele já havia estado, ao fim de 22 anos de casados quase 23, meu pai arranjou outra pessoa, minha mãe deu-lhe a escolher, ela, ou a outra, ele não escolheu, e minha mãe fez a escolha, pô-lo com “dono”, nessa altura a minha mãe estava desempregada, tinha dois filhos para criar, um deles com problemas de saúde, que tinha de viajar de 3 em 3 meses a Lisboa para fazer tratamentos, conforme o tempo foi passando minha mãe arranjou emprego, graças a Deus, e o filho com problemas de saúde deixava de ter de ir de 3 em 3, e passou a ir de 6 em 6 meses a Lisboa, depois passou a ser de ano a ano, ele (filho) melhorava, muitas das vezes mentia e dizia que nada se havia passado, não querendo preocupar nem a mãe e muito menos a irmã pequena. Mas conseguiu melhorar aos poucos.
Mas a vida parece que não gosta que tudo esteja bem, tem sempre de haver algo que tem de estar mal e ele piorou bastante, teve de viajar para África do Sul em tratamento, pois lá ele tinha os padrinhos que o receberiam e cuidariam dele enquanto ele lá estivesse.
Com a graça de Deus regressou ao fim de alguns meses bastante melhor, mas teria de ser vigiado e fazer sempre exames médicos, exames esses que só se faziam em Lisboa, e claro, a mãe sempre fazia de tudo para que esse filho tivesse bem, recorria à Segurança Social que na altura, tal como hoje pouco ou nada ajudava, a sorte é que ela tinha as irmãs em Lisboa que a ajudavam, e foi assim durante anos.
Ele não ficou curado, nem por sombras, mas atualmente consegue levar uma vida normalíssima como qualquer outra pessoa.
Os anos passaram, ele foi viver em Lisboa, onde trabalhou e conseguiu voltar a sorrir, mas …
Voltou desempregado mas para tirar um curso com a “famosa” promessa de que após o curso entrava no mundo do trabalho, mentira, ficou desempregado, mas ele não parou, não era seu feitio e ao fim de uns tempos conseguiu trabalho.
Os anos foram passando…
A irmã que ele adorava casou, e todos pareciam finalmente uma família muito feliz, nasceu o primeiro filho ao fim de alguns anitos, depois o segundo e mais tarde o terceiro… e já essa “família” não era mais uma família, a mãe ajudou várias vezes a filha e o genro, e até os netos, o irmão fez o mesmo, mas tudo ficou no esquecimento….
Hoje a irmã, quase que o odeia, não liga a mínima importância à sua mãe, mas sabe criticar a forma como o irmão toma conta da mãe, com Alzheimer, com diabetes, problemas de coração, osteoporose e uma outra quantidade de problemas de saúde, acusando-o, e citando-a: “fazes tudo à tua maneira”, “a mãe não tem Alzheimer, tu é que inventas-te tudo isso” (de salientar que ela é professora primária e o marido que também concorda com ela é enfermeiro), “claro que não visito a mãe para manter a minha sanidade mental” e outras tantas que nem vale continuar.
O que conto aqui, são pedacinhos de vários pedacinhos de quase 50 anos de vida, são desabafos de um velho, que já começou perdendo a esperança de viver, de encontrar alguém com quem dividir e compartilhar a vida, bons e maus momentos, que já começou perdendo o interesse na vida, isto é, se alguma vez eu vivi, ou apenas sobrevivi em meio a uma selva urbana e desumana como é esta em que muitos conseguem e outros tantos caiem no mais fundo dos poços.
E é esta uma pequenininha parte dos quase 50 anos de “vida” da qual jamais irei esquecer...
Quem sabe não regresse para falar um pouco mais…. e até mais detalhadamente.
 
 
Alvaro Gonçalves Correia de Lemos
 

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